sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Gramática do amor (ou Carta a quem se Ama)


Meu amor,

estive pensando sobre nós dois ontem à noite. Pensando que, pela primeira vez, eu realmente tenho dado muito mais importância aos meus momentos de felicidade, a esse amor que tenho sentido do que às pequenas coisas, às pequenas bobagens. Não que bobagens não passem pela minha cabeça. Infelizmente quanto mais nos apaixonamos mais bobagens tentam desesperadamente invadir a mente. A diferença é que elas têm ido embora na mesma velocidade em que chegam. Eu as chuto pra fora, elas somem e me concentro no que há de melhor em nós: NÓS. Nosso amor é cheio de interjeições, e ainda bem, não sobra espaço para conjunções adversativas invadirem nossa sentença.
“Onde há muito sentimento, há muita dor”. Da Vinci até poderia ser taxado de pessimista. Mas seu pensamento é simples. Quando estamos nesse estado de paixão nossa preocupação com o outro redobra, nosso medo aumenta, a sensação de estar assim tão vulnerável a esse sentimento nos deixa sensíveis e conseqüentemente, deixa o coração aberto e frágil demais. Mas, tenho aprendido - e colocado em prática - que a dor não deve nunca, nunca andar lado a lado com o amor. Não! Amar não é sofrer mesmo. Amar deve ser monossilábico, não pode ser separado, não, não... É oxítona terminada em ar: aproveitar, vivenciar, apaixonar, tentar.
Lembro-me daquelas semanas nas quais tentávamos nos encontrar por meio dos telefonemas, de toda aquela agonia e aquela sensação de estar vivendo algo tão inesperado com alguém que ao mesmo tempo estava tão longe e tão perto, e que de repente passou a estar apenas tão perto, cada vez mais perto. E isso foi ficando tão gostoso, que se tornou realmente difícil não acreditar em destino.
Mas, que diabos é isso que tem consumido minha alma? Segundo o Houaiss:
AMOR ■ substantivo masculino
1 forma de interação psicológica ou psicobiológica entre pessoas, seja por afinidade imanente, seja por formalidade social;
2 atração afetiva ou física que, devido a certa afinidade, um ser manifesta por outro;2.1 forte afeição por outra pessoa, nascida de laços de consangüinidade ou de relações sociais;
2.2 atração baseada no desejo sexual; afeição e ternura sentida por amantes;
2.3 afeição baseada em admiração, benevolência ou interesses comuns; calorosa amizade; forte afinidade;
Além de dar definições mil sobre amor platônico, socrático, cortês, amor livre, amor físico, relaciona-o com religião e até paganismo.
Mas quem é esse tal de Houaiss? Aurélio Buarque de Hollanda era o tio dicionarista do Chico, e em se tratando dessa linhagem dos Buarque de Hollanda, tudo bem, tem meu merecido respeito, e mesmo assim eu não admito que ele coloque em um dicionário a definição para uma coisa como essa: abstrata, indecifrável e indefinível! Imagina esse tal de Antônio Houaiss! E daí que ele entrou pra Academia Brasileira de Letras? E daí se ele foi professor, diplomata, filólogo, lexicógrafo e ensaísta? Eu nem sei o que é lexicógrafo! E o que ele pensa que sabe de amor pra classificá-lo em itens e subitens, da forma mais desrespeitosa possível! Para falar de amor, esqueça a regra gramatical habitual. Amor é um verbo, e não um substantivo, começa daí. E verbo intransitivo. A gente ama e não importa a quem, nem precisa de preposição. A gente simplesmente ama. O amor deve ser sempre conjugado no modo indicativo, e que o tempo seja presente, mas nunca, nunca no modo imperativo. O amor tem que ser flexionado na voz reflexiva, nunca na voz ativa, muito menos na voz passiva, para que o sujeito seja sempre agente e paciente ao mesmo tempo. O amor é gerúndio e infinitivo ao mesmo tempo! Amando, sentindo, vivendo, um processo verbal em curso, mas que não se deve situar no tempo. O amor não é um verbo irregular, nem defectivo, de conjugação incompleta, não é impessoal. O amor correspondido é um verbo abundante, que possui duas ou mais formas de valor idêntico. O amor é pra ser conjugado na segunda pessoa, ao lado de todos os outros verbos que assim se conjugam: fazer, viver, valer. De grau superlativo, absoluto, comum de dois gêneros! Advérbio de lugar, tempo, modo, de intensidade, afirmação. Plural, pronome composto e jamais, jamais, deve-se transformar o amor em um pronome possessivo, para que, quando ele virar pretérito, possa ser mais-que-perfeito.
Então, amor, cheguei a conclusão de que o amor é mesmo muito fácil de ser conjugado e que esse Houaiss não pode saber mesmo mais que nós dois. Se o seu forte for matemática, a gente soma, multiplica esse sentimento, o transforma em uma equação, em uma intersecção, eleva ao cubo esse conjunto infinito. Eu sinto, sei, tenho absoluta certeza, como 2 e 2 são 4 que temos uma química perfeita que nenhuma lei da física explica – como dois corpos podem ocupar um espaço ao mesmo tempo – e que não há história no mundo que barre a nossa, em qualquer espaço geográfico desse planeta, mas principalmente que o nosso romance é uma escola lírica, um soneto de rimas ricas, uma epopéia! Pra sempre, todo sempre.
Te amo!
Com amor, sua Thalita.

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